Perto do polo sul da Lua, encontram-se dois cânions formados por processos muito diferentes dos que moldam as paisagens da Terra. Pesquisas recentes revelam que esses cânions, localizados na bacia de impacto Schrödinger, foram esculpidos em menos de 10 minutos por detritos rochosos lançados violentamente para o espaço durante o impacto de um asteroide ou cometa, ocorrido há cerca de 3,8 bilhões de anos. Essa colisão colossal liberou uma quantidade de energia estimada em 130 vezes o poder combinado de todas as mais recentes armas nucleares, segundo o geólogo David Kring.
Os cientistas mapearam os cânions utilizando dados da sonda Orbitador de Reconhecimento Lunar da NASA e empregaram simulações computacionais para modelar os padrões de fluxo e a velocidade dos detritos. Os resultados indicam que o material viajou a velocidades de até 3.600 quilômetros por hora. O maior dos dois cânions, chamado Vallis Planck, possui cerca de 280 quilômetros de comprimento e 3,5 quilômetros de profundidade. O segundo, Vallis Schrödinger, tem aproximadamente 270 quilômetros de extensão e 2,7 quilômetros de profundidade.
Esse impacto ocorreu durante um período conhecido como Grande Bombardeio Tardio, quando o sistema solar interno sofreu intensa atividade de asteroides e cometas. Acredita-se que esse bombardeio tenha sido desencadeado por mudanças nas órbitas dos gigantes gasosos — Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. O corpo celeste que atingiu a Lua teria cerca de 25 quilômetros de diâmetro, consideravelmente maior que o asteroide responsável pela extinção dos dinossauros na Terra, há 66 milhões de anos.
“Quando o asteroide ou cometa colidiu com a superfície lunar, ele escavou um enorme volume de rocha, lançando-o ao espaço acima da Lua. À medida que essa cortina de detritos colapsava, aglomerados de rochas despencavam de volta, criando uma série de impactos menores que, efetivamente, esculpiram os cânions. Ao redor dessas formações, a paisagem foi coberta por detritos,” explicou Kring.
Os cânions aparecem como cicatrizes lineares que se irradiam a partir de uma grande cratera de impacto circular, intercaladas por crateras menores de colisões não relacionadas. Esse evento marcou um dos últimos grandes impactos tanto na Lua quanto na Terra durante a fase de bombardeio do início do sistema solar. Enquanto a Terra não apresenta mais evidências visíveis desses impactos antigos, devido ao constante processo de reciclagem da crosta por meio da tectônica de placas, a Lua preserva esses traços. Ao contrário da Terra, a Lua não possui atividade tectônica, o que mantém sua superfície relativamente inalterada ao longo de bilhões de anos.
Essas descobertas têm implicações significativas para a futura exploração lunar. A bacia de impacto Schrödinger está localizada próxima à zona de exploração da missão Artemis da NASA, que pretende levar astronautas de volta à Lua pela primeira vez desde a era Apollo.
“Os detritos do impacto de Schrödinger foram dispersos para longe do polo sul lunar, deixando rochas antigas próximas da superfície nas regiões polares — exatamente onde os astronautas da Artemis explorarão. Isso facilitará a coleta de amostras das épocas mais antigas da história geológica da Lua,” afirmou Kring.
Essas rochas antigas poderão ajudar os cientistas a testar hipóteses fundamentais sobre a origem da Lua, incluindo a teoria de que ela se formou após a colisão de um corpo do tamanho de Marte com a Terra, ejetando material derretido para o espaço. Além disso, poderão fornecer evidências para apoiar a ideia de que, nos primórdios, a superfície lunar foi coberta por um oceano de extensão global de magma.