Nascido e criado em Matinhos, no Litoral do Paraná, Jorge Polvilho tem contato com a água salgada da praia desde sempre. Sua família é caiçara, todos pescadores no município. Quando estava para completar 10 anos, ganhou do pai o presente que mudaria sua vida: a primeira prancha de surf.
Desde então, já são mais de 30 anos de surfe, muitas pranchas, infinitas ondas e uma prateleira repleta de títulos conquistados. Experiência, porém, que precisou ser atualizada para não fazer feio perante os alunos matriculados nos projetos esportivos que desenvolve na cidade.
É que, depois do início da obra de revitalização da orla do balneário, no ano passado, o mar de Matinhos mudou. Ganhou novos points para o surf, melhorando as condições para quem curte passar a vida desafiando os oceanos.
Com isso, a cidade que já era conhecida no mundo do surf por ter a maior, mais longa e extensa direita (percurso da onda) no Pico de Matinhos, ganhou agora, pelo menos, outros três pontos para a prática do esporte: na Barrinha, próximo à desembocadura do Rio Matinhos, e nos balneários Riviera e Flórida.
“Foi uma surpresa. A construção desses espigões ajudou a acumular areia ao redor das estruturas, o que fez surgir novas e melhores ondas”, afirma Polvinho.
“Nós, surfistas, sabemos que a onda quebra somente quando tem fundo de areia, fundo de coral ou fundo de pedra. Quando anunciaram a obra, sabia que ia melhorar já que, quanto mais areia, maior a possibilidade de a onda quebrar”, acrescenta.
Segundo ele, o engordamento da faixa de areia da praia e a construção das estruturas marítimas (dois guias-correntes, dois headlands e um espigão) permitirão à cidade ter a condição ideal para a prática do surf em todos os momentos da temporada, reforçando a condição de Matinhos ser uma das capitais do esporte no País, ampliando possibilidades dentro do calendário esportivo.
“Antigamente a maré enchia e acabavam as ondas. Hoje não, temos surf o dia todo, o ano todo. Por conta da areia, quando a maré seca, dá onda, e quando a maré fica cheia, também dá onda”.
Na Barrinha, a nova configuração das ondas já é realidade. “O pessoal tem agora uma nova opção, boa e repleta de ondas”, comenta o farmacêutico Bruno Salgado, de Curitiba, que frequenta o Pico de Matinhos há dois anos e agora passou a se aventurar pelos points vizinhos.
Amigo de Bruno, o também farmacêutico Vinicius Ferreira é natural de João Pessoa (PB). Ele gostou tanto da revitalização em Matinhos que espera que façam o mesmo em seu estado. “Lá em João Pessoa, praias tradicionais como Cambaú e Cabo Branco precisam de uma infraestrutura como essa aqui”, diz.
Segundo José Luis Scroccaro, diretor de Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos do Instituto Água e Terra (IAT), órgão responsável pela gestão da obra dentro do Governo do Estado, a implantação de estruturas de contenção das cheias provocadas pela maré alta proporcionou que as ondas se quebrem de forma diferenciada na região.
Além disso, a construção das peças por meio de tetrápodes – peças de concreto com cerca de 3 metros de altura e 4,3 metros cúbicos de volume, pesando, cada uma, entre 10 e 12 toneladas – também colaboraram.
“Por ser concentrado e ter em sua formação areia, pedra e magnetita, que é um material mais denso, ele consegue ser mais resistente ao impacto das ondas e ressacas, aumentando a vida útil das estruturas e, consequentemente, da areia depositada no Litoral”, destaca.
Matinhos formou diversos surfistas para o País. Destaque para Jihad Khodr, bicampeão brasileiro e que também fez parte da elite do surf mundial, Bruna Schmitz, presente no World Championship Tour (WCT), e Peterson Crisanto.
Há também no local uma estátua em homenagem ao Peterson Rosa, surfista nascido no Guarujá (SP), mas criado desde criança em Matinhos, e que possui uma coleção de vitórias nacionais e mundiais.
No longboard, os destaques são Thiara Mandelli e Marco Kamers. No bodyboard, Cláudio Marques, Sanderson Trevisan e Lorraine Lima. Já a nova geração conta com Luara Mandelli e Gabi Vaz.
A revitalização da Orla de Matinhos alcançou 88,3% de execução em outubro, na obra como um todo. Estruturas marítimas como o espigão da Praia Brava; o guia de correntes da Avenida Paraná, e os headlands dos balneários Riviera e Flórida estão concluídos. Já a construção dos guias-correntes de Matinhos está em 92,5% e deve ser finalizada ainda neste ano.
A obra é feita em duas etapas, num valor total de R$ 500 milhões. A fase inicial, com orçamento de R$ 314,9 milhões, abrange serviços de engorda da faixa de areia por meio de aterro hidráulico; estruturas marítimas semirrígidas; canais de macrodrenagem e redes de microdrenagem e revitalização urbanística da orla marítima com o plantio de espécies nativas.
O projeto é acompanhado de melhorias na pavimentação asfáltica e recuperação de vias urbanas. O objetivo é minimizar os impactos gerados pela combinação do desequilíbrio de sedimentos, ocupações mal planejadas e fenômenos naturais, como chuvas fortes e ressacas que costumeiramente atingem o Litoral. Esses fatores vêm comprometendo boa parte da infraestrutura urbana, turística e de lazer em Matinhos.
As intervenções serão feitas ao longo de 6,3 quilômetros entre o Morro do Boi e o Balneário Flórida. Em uma segunda etapa, ainda sem previsão de data, será recuperado o trecho de 1,7 quilômetro entre os balneários Flórida e Saint Etienne. Haverá, também, a instalação de novos equipamentos urbanos, como ciclovia, pista de caminhada e corrida, pista de acessibilidade e calçada.