As duas primeiras missões tripuladas da NASA no programa Artemis para a Lua foram adiadas para 2026 e 2027, respectivamente, o que pode ter grandes implicações para o programa e para a concorrência com a China pela liderança no espaço.
A missão Artemis 2, que enviará três astronautas americanos e um canadense ao redor da Lua, estava programada para setembro de 2025, mas foi remarcada para abril de 2026, conforme anúncio da NASA em 5 de dezembro. Já a Artemis 3, que colocará humanos na superfície lunar pela primeira vez em mais de meio século, foi adiada de 2026 para meados de 2027.
Essas mudanças podem trazer grandes repercussões geopolíticas. Tanto os EUA quanto a China estão em busca de parceiros para seus respectivos programas — Artemis e a Estação Internacional de Pesquisa Lunar (ILRS). Caso o Artemis seja encerrado, os esforços chineses poderão ganhar um grande impulso.
Os adiamentos também podem impactar as parcerias da NASA com a Agência Espacial Europeia (ESA) e seus estados-membros, além de Japão, Emirados Árabes Unidos e outros países envolvidos no Artemis e em projetos como o Gateway lunar. Vale lembrar que o programa Artemis foi iniciado durante o governo Trump, e o próximo presidente pode querer supervisionar um retorno triunfal à Lua.
No dia 5 de dezembro, autoridades da NASA reforçaram que o Artemis é uma pedra angular para o avanço da exploração humana, desde a Lua até Marte e além. A agência busca manter uma cadência de lançamentos consistente, reduzindo os intervalos entre missões e incorporando lições aprendidas. No entanto, mudanças podem estar a caminho para o Artemis e seus planos futuros.
Os atrasos mais recentes estão parcialmente relacionados a um problema com a espaçonave Orion e seu escudo térmico, detectado após uma reentrada atmosférica durante a missão Artemis 1, sem tripulação, no final de 2022.
“Determinamos que, enquanto a cápsula realizava reentradas planejadas em sequência, o calor acumulado na camada externa do escudo térmico causou a formação de gases, que ficaram presos, levando a rachaduras e desprendimento irregular da camada externa”, explicou Pam Melroy, administradora adjunta da NASA, em uma coletiva de imprensa.
A Artemis 2 ainda usará a Orion, mas com uma trajetória de reentrada diferente para gerenciar melhor o calor. “A segurança de nossos astronautas é sempre a prioridade em nossas decisões”, afirmou Bill Nelson, administrador da NASA.
O adiamento permitirá à NASA mais tempo para entender e resolver completamente o problema da Orion, além de preparar os sistemas de pouso e outros aspectos, como os trajes para atividades extraveiculares na Lua. Isso também proporcionará melhorias e maior segurança, embora possa prejudicar o ritmo dos fornecedores e contratantes, o que é preocupante, pois intervalos longos podem gerar ineficiências e perda de expertise.
Mais importante, o anúncio dos atrasos ocorre em um momento de incerteza para a NASA, trazendo dúvidas sobre as missões, sua arquitetura e até mesmo o futuro do programa Artemis.
Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos em novembro e assumirá a Casa Branca em janeiro. Sua campanha focou em cortes orçamentários e redução de impostos, o que pode representar um risco para programas considerados caros ou ineficientes.
Um aspecto do Artemis que pode estar em risco imediato é o Space Launch System (SLS), o gigantesco foguete projetado para lançar a Orion à Lua. O SLS tem sido alvo de críticas por ultrapassagens de custo e atrasos no desenvolvimento. A construção de uma torre móvel para o SLS também sofreu problemas similares. Em setembro de 2023, o Escritório de Responsabilidade Governamental dos EUA (GAO) classificou o foguete como “inviável” para uma exploração espacial sustentável.
Trump indicou Jared Isaacman, bilionário com dois voos espaciais privados utilizando tecnologia da SpaceX, para liderar a NASA. Elon Musk, um dos maiores apoiadores de Trump, pode influenciar diretamente as políticas espaciais da nova administração.
Isso levanta a possibilidade de que o novo governo substitua o SLS pelo Starship, da SpaceX. O Starship já faz parte da arquitetura das futuras missões Artemis, e sua reutilização e custo reduzido, se comprovados, ofereceriam vantagens sobre o caro e descartável SLS. Embora essa mudança não seja simples, os novos atrasos podem torná-la mais viável.
No cenário internacional, o adiamento da Artemis 3 para 2027 reduz a diferença entre o retorno dos EUA à Lua e a tentativa da China de levar seus primeiros astronautas à superfície lunar. Pequim está comprometida com uma missão para colocar dois astronautas na Lua antes de 2030, desenvolvendo os elementos necessários, como foguetes, espaçonaves, módulos de pouso e plataformas de lançamento.
Realizar o primeiro pouso tripulado na Lua neste século seria uma vitória simbólica para qualquer um dos países, demonstrando avanço tecnológico e liderança no espaço.
Há ainda a possibilidade de a NASA abandonar a Lua como objetivo, focando em missões mais profundas. Embora a agência veja a Lua como um passo intermediário para Marte, ela poderia considerar um avanço direto para o planeta vermelho.
Musk tem sido vocal sobre seus planos de levar humanos a Marte, e o Starship é fundamental para esse esforço. Uma administração alinhada com Musk poderia priorizar o Starship e redirecionar o foco da Lua para Marte. No entanto, mudanças dessa magnitude dependeriam de um complexo equilíbrio entre indivíduos e instituições como o Congresso, tornando-as difíceis de implementar.